Desapego
“Então eu soltei a cordinha que
te prendia ao meu dedo e te deixei voar...
Enfim leve, levíssima, quase
flutuando.”
[Karla Thayse]
[Karla Thayse]
"Garçom! Uma dose de amnésia e duas de desapego, por favor."
[Caio Fernando Abreu]
Quando minha cachorra morreu,
chorei dias a fio. Durante anos aquele serzinho de 4 patas, mudo das palavras
foi minha companhia fiel e sincera, até quando depois de uma bronca por ter
destruído um chinelo ou qualquer coisa assim, deitava ao meu lado no sofá e
colocava a cabeça sobre meu colo, como quem diz: Me perdoe – E eu perdoava,
mesmo sabendo que ela faria novamente.
Descobri assim que apego é uma
coisa complicada. Logo eu, que sempre preguei o desapego como estilo de vida me
vi as voltas com seu oposto. Vivi nesses meus 28 anos inúmeras perdas, pessoas
queridas que partiram, amores que passaram, amigos que foram do mesmo jeito que
vieram, sofri cada uma dessas despedidas e por sua vez, cada um desses
desapegos.
A gente se apega às pessoas por
afinidade, apego é criar raízes, é ter história, é fazer laços embora muitas
vezes a gente faça nós, daqueles de marinheiro, difíceis e complexos de
desfazer. E é aí que está o nosso grande erro, ao criar apego, sem perceber
criamos dependência, geramos em nós uma falta do outro que até então não existia,
tatuamos presenças, gravamos a ferro e fogo na memória permanente talvez para
não deixar que a correria do tempo - que engole as lembranças - apague aquelas que
nos são caras.
Aqui na rua da minha casa tinha
uma castanheira enorme na calçada do vizinho, com raízes imensas e que por fim
começaram a quebrar o asfalto, destruir a calçada, atrapalhar o trânsito das
pessoas, dos carros, enfim, me parece uma boa analogia, exatamente o que o
apego pode fazer quando se torna maior que um simples gostar, querer bem,
querer perto, mas deixar livre. Apego também destrói sonhos, quebra
expectativas, atrapalha o transito de nossas vidas que deve sempre seguir em
frente.
Desapego, embora muita gente não
concorde é uma forma de amar, mas com a consciência que não temos posse.
Desapegar-se é ter a certeza de que o outro está porque quer e não porque
queremos. Desapegar-se é aprender que as coisas vão e vem, vão e são como o
tempo, como cantou Lulu Santos. Hoje eu tenho um novo cachorro, a árvore na
calçada do vizinho virou ‘tamboretes’ e eu a cada dia que passa desfaço um ou
outro nó que por ventura tenha feito pelo caminho, refazendo quando possível –
e se necessário – em laços de fitas de cetim coloridas que a qualquer momento, ou quando a vida ou o
destino assim quiserem, podem se desfazer, sem dor, sem rancor, sem sofrer,
ficando ao sabor do vento a certeza de que esta é a ordem das coisas e que tudo
está como devia estar. Li em algum lugar, ‘Nó aperta, laço efeita’, e é bom por
aí mesmo.
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Postscriptum:
Caros amigos. Em pleno inferno astral um post para retomar os trabalhos.
Doce abraço,
Bailarina
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Trilha Sonora:
Pra cobrir a solidão (Teresa Cristina e Semente_Teresa Cristina e Zé Renato)
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