Um céu cheio de música

(Leia ao som de Sky full of song, da Florence and the machine)

Eu nunca pensei que ia chegar aos 37 desse jeito: trancada em casa, sem poder sair, revoltada com a atual presidência (#ForaBolsonaro), preocupada com os próximos meses, sem receber os abraços e beijos dos meus. E, olha, eu já tinha pensando em chegar aos 37 casada com filhos, casada sem filhos, solteira sem filhos, solteira com filhos, viúva alegre, divorciada com 5 gatos, 12 cachorros e 1 jabuti, eu também pensei em chegar aos 37 morando em outro país, trabalhando numa multinacional, dirigindo pra tudo quando é lugar e com o cabelo menos grisalho do que ele está hoje.

Mas, nem de longe me assombrava o pensamento de chegar  à uma nova idade em meio à uma pandemia, em confinamento, com medo,  deslocada da rotina que, embora critiquem alguns, é o que dá sentido na vida da gente. Eu nunca, nem nos meus piores pesadelos ou crises de ansiedade, consegui pensar que eu estaria assim, como estou  agora, tentando manter a sanidade em meio ao caos global. Talvez por isso, escrever fosse a saída mais acertada pro dia de hoje. Porque, com disse Clarice Lispector, ‘eu escrevo como se fosse salvar a vida de alguém, provavelmente a minha própria’, não me interessa o bloqueio criativo, tampouco a coerência e coesão, eu precisava escrever como um ato da minha imposição a esses tempos:  eu estou aqui.

Esse caos vai passar, vai sim! Talvez demore para nascer uma estrela, talvez ainda leve muito tempo pra que eu esteja segura nos abraços de todo mundo que amo, talvez seja esse isolamento necessário pra gente refletir para onde estamos caminhando e, sendo o ser humano o animal social que é, se esse caminho se dará sozinho na nossa própria concha,  ou na coletividade, na empatia e, sobretudo, num senso de responsabilidade global que temos para com o outro, onde quer que o outro esteja.  Estamos todos no mesmo barco, mas não no mesmo bote salva-vidas, precisamos refletir sobre isso agora, nesse momento, nessa estação, nesse virar de ano, nessa conjunção astral. Refletir nos dará um norte, refletir me dará esperança em dias melhores. Desculpe por te receber assim, 37. Era pra casa estar arrumada, com poucas coisas fora do lugar e com um sentimento de gratidão imenso por mais uma volta completa nesse relógio doido da vida, espero que você compreenda a situação, esperando que o mundo lá fora dê o melhor de si, fico aqui dentro com a minha parede amarela, dando o melhor de mim, uma hora tudo se ajeita, aí será um feliz aniversário, enfim.

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